Pessoas com tricotilomania não resistem à compulsão de
arrancar os pelos do corpo – tiram não
apenas os fios do couro cabeludo, mas também do púbis, das sobrancelhas e dos
cílios; em muitos casos, a patologia, que pode começar na infância, aparece
com sintomas de depressão e ansiedade.
Todo mundo certamente já puxou os cabelos enquanto sonhava acordado ou os enrolou nos dedos enquanto refletia sobre alguma coisa. Principalmente as mulheres arrancam um ou outro por motivos estéticos. No entanto, parece impensável que uma pessoa arranque seus cabelos diariamente, às vezes durante horas, até a cabeça estar repleta de pontos calvos.
Porém, já em 1889 o médico francês François Henri Hallpeau
(1842-1919) descreveu um paciente que puxava
os cabelos aos tufos. Ele batizou o fenômeno de “tricotilomania” (do grego trico = cabelo, fio; tillo = arrancar). O
reconhecimento de que se trata de um quadro patológico específico, no entanto,
surgiu apenas no fim do século 20.
A característica básica do distúrbio é o impulso, no mínimo durante alguns períodos, de puxar cabelos ou pelos. Parte das pessoas afetadas por essa compulsão seleciona os fios objetivamente. Por exemplo, os cabelos brancos, os que ficam em pé ou que parecem desarrumados. Outros os puxam de forma inconsciente e automática, e só percebem o gesto mais tarde. Vários nem sentem dor ao arrancá-los. Típico da tricotilomania é também o ato de “brincar” com os cabelos arrancados. Os pacientes os passam sobre os lábios, colocam na boca ou os enlaçam entre os dedos. Frequentemente, várias dessas características se manifestam na mesma pessoa: ela arranca os cabelos automaticamente diante da televisão ou ao ler, enquanto de manhã e de noite puxa especificamente alguns deles diante do espelho do banheiro.
Hoje sabemos que a
tricotilomania não é uma doença tão rara. Um estudo realizado em 2009 pelos
médicos americanos Danny Duke e seus colegas da Universidade Oregon Health
& Science, em Portland, demonstrou que o
arrancar de cabelos patológico ocorre em cerca de 1,2% dos americanos.
Aproximadamente a metade dessas pessoas preenchia todos os critérios clínicos
para o diagnóstico de tricotilomania: imediatamente antes de arrancar os
cabelos, estão sob pressão interna e,
depois, experimentam grande alívio. Ao mesmo tempo, elas se sentem
claramente prejudicadas pelo distúrbio.
Segundo esse e vários outros estudos epidemiológicos, mulheres e homens são afetados com a mesma
frequência. Quase sempre o arrancar de cabelos leva à rarefação e ao surgimento de pontos de calvície, que as pessoas tentam encobrir com penteados, perucas ou
cosméticos. Mas os pelos existentes em outras partes do corpo também podem
ser vítimas do transtorno.
Como em geral elas se envergonham de seu comportamento e
temem ser descobertas, muitas não
frequentam piscinas ou praias, evitam ir ao cabeleireiro, não praticam esportes
em companhia de outras pessoas e temem todo contato social mais próximo. E
podem surgir outras psicopatologias
associadas à tricotilomania. As mais comuns são depressão, transtornos de ansiedade e abuso do álcool, mas não
raramente ocorrem também distúrbios de
personalidade. Alguns pacientes engolem
os próprios cabelos arrancados, o que pode causar a formação de um novelo
de cabelos (tricobezoar) no estômago ou no intestino. Como
consequência, podem surgir cólicas
ou, mais raramente, obstrução
intestinal.
Os pesquisadores concluíram que em pelo menos 6% dos casos os sintomas surgiram ainda na infância, antes dos seis anos. Na maioria das situações, porém, o arrancar de cabelos patológico se inicia na adolescência, entre os 11 e 15 anos. Mas, ocasionalmente, o distúrbio se manifesta só na idade adulta.
Não existe uma única causa para a tricotilomania. Tanto aspectos psicológicos e sociais quanto neurobiológicos e genéticos são considerados desencadeantes. Quase sempre há uma combinação desses vários fatores. Além disso, o transtorno não se apresenta de forma homogênea, mas pode ser subdividido em três grupos.
O transtorno se inicia, pelo menos em parte dos pacientes, devido a tensões dentro da família, problemas na escola ou dificuldades de relacionamento com outras crianças. Paralelamente, sentimentos depressivos, estresse e problemas para lidar com a raiva também estão em sua base. O arrancar de cabelos é sentido então como uma distração, um consolo capaz de minimizar a tensão, e é justamente esse caráter prazeroso que reforça o comportamento.
Nesse sentido, a
tricotilomania serve para regular estados emocionais desagradáveis, dos
quais os pacientes nem sempre se dão conta claramente. Muitas vezes, brincar
com os fios entre os dedos e tocá-los com os lábios remete a uma sensação de aconchego experimentado
quando a pessoa ainda era bebê e tocava os cabelos da mãe ao ser amamentada ou
apenas aninhada no colo.
Enquanto ainda não há nenhuma prova científica da
efetividade de tratamentos alternativos, como dietas ou acupuntura, uma forma
específica da psicoterapia tem se revelado eficaz. A terapia comportamental
cognitiva é um exemplo disso. Ela deve ser adequada individualmente ao
paciente: é importante que o terapeuta
considere exatamente quais fatores desempenham um papel no quadro clínico.
Se houver, por exemplo, uma associação entre inibições sociais e a
tricotilomania, a prioridade é reforçar
a autoconfiança e as competências do paciente. Caso o transtorno seja
sintoma de experiências traumáticas, estas devem ser primariamente abordadas.
Em alguns casos, é suficiente a redução do ato de arrancar cabelos por meio de técnicas específicas. Para tanto, o chamado treinamento para reversão de hábitos (HRT, sigla em inglês de habit reversal training) é bastante adequado. Originalmente, Nathan H. Azrin e Robert G. Nunn, do Hospital Estadual de Anna, Illinois, desenvolveram esse método para o tratamento de tiques motores, mas obtiveram sucesso também no caso do roer compulsivo de unhas, chupar dedos e tricotilomania.
Fonte: Mente&Cérebro
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