Às vezes é preciso uma
bofetada que – pleft! – nos devolva de volta à vida
Desilusão
é uma experiência terrível. Num momento qualquer, você está cheio de esperança.
No outro, seu mundo veio abaixo. Como uma repentina bofetada, a desilusão
machuca, desnorteia e humilha. É o evento dramático que, na vida amorosa,
separa a realidade do sonho, os homens dos meninos e os tolos dos sábios. A
desilusão é nosso diploma. Quem não passou por ela é um inocente. Ainda não
sabe de nada.
Você, apaixonado, sugere à namorada que talvez seja hora de fazer planos e morar juntos. Ela responde, cheia de dedos, que talvez não esteja assim tão envolvida com você. Pleft!
Encantada
com o sujeito, você pergunta, toda bonitinha, se o que rola entre vocês é um
namoro – e ele diz, sem hesitar, que também sai com outra garota e não quer
compromisso. Pleft!
Com
essas histórias, quero dizer, ao contrário das lamúrias frequentes, que
desilusão é bom. Quem nos desilude nos abre os olhos e nos descortina o mundo
verdadeiro. Por isso, nos presta um grande serviço.
O
iludido acredita, essencialmente, que o outro sente por ele o mesmo que ele
sente pelo outro. Vive a fantasia de ser amado ou, pelo menos, tem esperança de
um dia ser correspondido. É um sonhador que pode passar anos caminhando no
interior do seu sonho, vendo apenas o que deseja ver. A desilusão é o
despertar. Deveria ser saudada como libertação, mas costuma ser recebida com
ressentimento. A pena de si mesmo é maior que a gratidão.
Na
verdade, o inimigo é quem nos ilude. Faz mal aquele que, por fraqueza ou
piedade – muitas vezes por vaidade – alimenta nossos sentimentos infundados.
Quem nos olha nos olhos e diz a verdade merece nosso respeito. Demonstra
respeito por nós, ainda que nos magoe.
A
verdade, é importante que se diga, nem sempre é nítida. Quando se trata de
afeto, somos criaturas confusas, habitadas por dúvidas e contradições. Por
isso, mais importante que aquilo ouvimos é o que vemos. Mais importante que
sentimentos, são ações. Se o sujeito parece ter por você o maior carinho, mas é
sua amiga que ele chama para sair, parece que é da amiga que ele gosta – embora
talvez nem saiba. As decisões dele contam tudo que você precisa saber, desde
que você as conheça. Quem diz o que sente, mas esconde o que faz, ilude.
Eis
uma boa máxima: não me diga o que você sente, me conte o que você faz. Da
minha parte, tendo vivido ilusões e desilusões, prefiro as últimas. Elas me
salvaram de vexames profundos, me tiraram de enganos demorados, me abriram
portas que eu desconhecia e me puseram no caminho certo. Tem sido assim com
todos que eu conheço. Os mais tristes, os mais dignos de piedade, são os que se
agarram a ilusões que todos em volta reconhecem, menos eles. A esses faz falta
uma desilusão.
Uma boa bofetada – pleft! – que os devolva de volta à vida.
por Ivan Martins