Compulsão à
sedução; Síndrome de Don Juan
O donjuanismo é um protótipo
particular de comportamento humano, classificação esta estribada
particularmente em valores culturais e morais.
Fica mais difícil entender os novos
tempos, quando consideramos que as expressões ficar com... e sair com... significam a mesma coisa, apesar dos
termos ficar e sair serem
antagônicos. Donjuanismo é uma expressão em desuso
que veio à tona há algum tempo, depois do filme Don Juan de Marco, com Marlon
Brando e Johnny Depp. O filme Don Juan de Marco foi escrito e dirigido por
Jeremy Leven.
Don
Juan
é um personagem literário tido como símbolo
da libertinagem. O primeiro romance com referência ao personagem foi a obra
El Burlador de Sevilla, de 1630, do
dramaturgo espanhol Tirso de Molina. Posteriormente Don Jun aparece em José
Zorrilla com a estória de Don Juan Tenorio. A figura de Don Juan foi também
cultuada na música, em obras de Strauss e Mozart, este último com a ópera Don
Giovanni, composta em 1787. Outro paradigma do eterno sedutor é a figura de Casanova,
conhecida pela autobiografia do veneziano Giovanni Jacopo Casanova.
Mas a figura do eterno sedutor continua atrelada à Don Juan, que
aparece ainda na obra de Molière, em Le Festin de Pierre, no poema satírico de
Byron chamado simplesmente Don Juan, no drama de Bernard Shaw, chamado Man and
Superman.
Segundo Jung, para quem qualquer forma de arte, assim como os
mitos, são veículos para a expressão do
inconsciente coletivo, Don Juan pode representar nossos arquétipos. Trata-se de um padrão de personalidade caracterizado por uma pessoa narcisista, enamorada, inescrupulosa, amada e odiada e que faz tudo valer para a conquista de uma
pessoa.
O donjuanismo representa um protótipo
particular de comportamento humano, classificada particularmente pelos valores culturais e morais. Não existe
essa denominação no CID.10 ou DSM.IV, mas isso não significa, absolutamente,
que por isso pessoas assim deixam de existir.
Independente das interpretações
psicanalíticas sobre o filme Dom Juan de Marco, interessa aqui apenas caracterizar um tipo de conduta atual;
a inclinação que as pessoas têm para
liberdade sexual explícita. A
característica principal do que se pode chamar hoje de donjuanismo, seria uma forte compulsão para sedução,
entretanto essa característica não é isolada nem única na personalidade da
pessoa, também não é exclusiva do sexo
masculino.
Descreve-se o donjuanismo como uma personalidade que necessita seduzir o tempo
todo, que aparentemente se enamora
da pessoa difícil mas, uma vez conquistada, a abandona por desinteresse. As
pessoas com esse traço não conseguem ficar
apegado a uma pessoa determinada, partindo
logo em busca de novas conquistas. Elas são os anarquistas do amor
(Sapetti), tornando válidos quaisquer meios para conquistar, não obstante, os sentimentos da outra pessoa não são
levados em consideração. Aliás, Foucault enfatiza essa questão ao dizer que
Don Juan arrebenta com as duas grandes
regras da civilização ocidental, a lei
da aliança e a lei do desejo fiel.
Em psiquiatria clínica, entretanto, o
desprezo para com o sentimento alheio pode ser critério para caracterizar uma atitude sociopática ou anti-social. Para o donjuan só
interessa o hedonismo, o instante do prazer e o triunfo sobre sua
conquista, principalmente quando a pessoa de seu interesse tem uma situação
civil proibida (casada, freira, irmã ou filha de amigo, etc ou os
correspondentes masculinos). Sobre essa característica o escritor Carlos
Fuentes, alega ao seu Don Juan a frase: "Porque nenhuma mulher me
interessa se não tiver um amante, marido, confessor ou Deus, ao qual pertença
...".
Normalmente essas pessoas ignoram a decência e a virtude moral,
mas seu papel social tenta mostrar o contrário; são eminentemente sedutores. O aspecto de desafio mobiliza o
donjuan, fazendo com que a conquista
amorosa tenha ares de esporte e competição, muitas vezes convidando amigos
para apostas sobre sua competência em conquistar essa ou aquela mulher. Não é raro que esses conquistadores tragam
listas e relações das mulheres conquistadas, tal como um troféu de caça.
Por outro lado, segundo Kaplan, deve
haver significativos sentimentos homossexuais latentes nesses indivíduos. Esse
autor considera que, levando para a cama
a mulher de outro, o donjuan estaria inconscientemente se relacionando com o
marido, motivo maior de seu prazer. Tanto que é maior o prazer quanto mais
expressivo é o marido ou namorado traído. O narcisismo
(traço feminóide) dessas pessoas é uma das características mais marcantes, a ponto delas amarem muito mais a si mesmas
que a qualquer outra pessoa conquistada. Outros autores acham o donjuanismo
um excesso do complexo de Édipo, ou fixação na mãe, já que muitos deles não
constituem família com nenhuma de suas conquistas e acabam vivendo para sempre
com suas mães.
Nos
casos mais sérios
a inclinação à sedução pode adquirir caráter de verdadeira compulsão, tal como acontece no jogo patológico. De
certa forma, apesar dessa conquista compulsiva servir-lhe para melhorar sua
sensação de segurança e auto-estima, uma
vez possuído o que desejava, já não o deseja mais. Em alguns casos o
donjuan começa a se desestimular com a conquista quando percebe que a pessoa conquistada já está apaixonada por ele.
Pode até nem haver necessidade do ato sexual a partir do momento em que ele
percebe que a pessoa aceita e deseja o sexo com ele. Por outro lado, se a
pessoa a ser conquistada é indiferente ou não
cede à sedução, o donjuan se torna mais obstinado ainda.
Não será totalmente lícito dizer, como
dizem alguns, que o donjuan se diverte com o sofrimento alheio. Na realidade
parece mais que seja insensível ao
sentimento alheio do que tenha prazer com ele. De fato, parece que eles não experimentam com o amor o mesmo
tipo de sentimento que as demais pessoas. O amor neles é um sentimento fugaz, passageiro e que,
continuadamente, tem o objeto-alvo renovado. Se algum déficit pode ser apurado na personalidade do donjuan, este se dá no controle da vontade.
Apesar dessa compulsão à sedução, isso
não significa que a pessoa portadora de donjuanismo seja, obrigatoriamente,
mais viril ou mais ativo sexualmente. Esse
quadro não deve ser confundido com a Atividade Sexual Compulsiva onde, aí
sim há hipersexualidade.
Portanto, a contínua sedução do donjuan
nem sempre se dá às custas de um desempenho sexual excepcional, mas sim, devido
à habilidade em oferecer às pessoas a
serem seduzidas, tudo aquilo que elas mais estão querendo. Nesse sentido,
todos eles são sempre muito inconstantes, desempenham
papeis sociais sempre teatrais e exclusivamente dirigidos à satisfação de
suas conquistas, por isso fazem sempre o tipo "príncipe encantado", tão cultuado pelo público feminino. As
pessoas sedutoras têm habilidade em perceber rapidamente os gostos e franquezas
de suas vítimas e são igualmente rápidos em atender as mais diversas
expectativas.
Há quem considere como uma das
características fundamentais da personalidade do donjuan uma acentuada imaturidade afetiva. O
aspecto volúvel e responsável pela constante troca de relacionamento pode
ser indício dessa imaturidade afetiva e indica, sobretudo, uma completa carência de responsabilidade ou medo de assumir os compromissos normais das
pessoas maduras (casamento, família, filhos, etc.).
Grito de Alerta
Gonzaguinha
Primeiro você me azucrina
Me entorta a cabeça
Me bota na boca
Um gosto amargo de fel...
Depois
Vem chorando desculpas
Assim meio pedindo
Querendo ganhar
Um bocado de mel...
Não vê que então eu me
rasgo
Engasgo, engulo
Reflito e estendo a mão
E assim nossa vida
É um rio secando
As pedras cortando
E eu vou perguntando:
Até quando?...
São tantas coisinhas miúdas
Roendo, comendo
Arrasando aos poucos
Com o nosso ideal
São frases perdidas num
mundo
De gritos e gestos
Num jogo de culpa
Que faz tanto mal...
Não quero a razão
Pois eu sei
O quanto estou errado
E o quanto já fiz destruir
Só sinto no ar o momento
Em que o copo está cheio
E que já não dá mais
Pra engolir...
Veja bem!
Nosso caso
É uma porta entreaberta
E eu busquei
A palavra mais certa
Vê se entende
O meu grito de alerta
Veja bem!
É o amor agitando o meu
coração
Há um lado carente
Dizendo que sim
E essa vida dá gente
Gritando que não...